terça-feira, 6 de setembro de 2011

Uma breve biografia de Graciliano Ramos


Graciliano Ramos viveu os primeiros anos em diversas cidades do Nordeste brasileiro. Terminando o segundo grau em Maceió, seguiu para o Rio de Janeiro, onde passou um tempo trabalhando como jornalista. Voltou para o Nordeste em setembro de 1915, fixando-se junto ao pai, que era comerciante em Palmeira dos Índios, Alagoas. Neste mesmo ano casou-se com Maria Augusta de Barros, que morreu em 1920, deixando-lhe quatro filhos.
Foi eleito prefeito de Palmeira dos Índios em 1927, tomando posse no ano seguinte. Ficou no cargo por dois anos, renunciando a 10 de abril de1930. Segundo uma das auto-descrições, "(...) Quando prefeito de uma cidade do interior, soltava os presos para construírem estradas." Os relatórios da prefeitura que escreveu nesse período chamaram a atenção de Augusto Frederico Schmidt, editor carioca que o animou a publicar Caetés (1933).
Entre 1930 e 1936 viveu em Maceió, trabalhando como diretor da Imprensa Oficial, professor e diretor da Instrução Pública do estado. Em 1934 havia publicado São Bernardo, e quando se preparava para publicar o próximo livro, foi preso em decorrência do pânico insuflado por Getúlio Vargas após a Intentona Comunista de 1935. Com ajuda de amigos, entre os quais José Lins do Rego, consegue publicar Angústia (1936), considerada por muitos críticos como sua melhor obra.
Em 1938 publicou Vidas Secas. Em seguida estabeleceu-se no Rio de Janeiro, como inspetor federal de ensino. Em 1945 ingressou no antigo Partido Comunista do Brasil - PCB (que nos anos sessenta dividiu-se em Partido Comunista Brasileiro - PCB - e Partido Comunista do Brasil - PCdoB), de orientação soviética e sob o comando deLuís Carlos Prestes; nos anos seguintes, realizaria algumas viagens a países europeus com a segunda esposa, Heloísa Medeiros Ramos, retratadas no livro Viagem (1954). Ainda em 1945, publicou Infância, relato autobiográfico.
Adoeceu gravemente em 1952. No começo de 1953 foi internado, mas acabou falecendo em 20 de março de 1953, aos 60 anos, vítima de câncer do pulmão.
O estilo formal de escrita e a caracterização do eu em constante conflito (até mesmo violento) com o mundo, a opressão e a dor seriam marcas de sua literatura. Graciliano foi indicado ao premio Brasil de literatura

Comentário crítico sobre São Bernardo

São Bernardo é um romance de confissão, aparentado com Dom Casmurro. Narrado em primeira pessoa, Paulo Honório, após o suicídio de Madalena, solitário, decadente, põe-se a registrar a história de sua ascensão a dono da Fazenda São Bernardo, de sua tragédia conjugal e da aridez de sua vida afetiva. Como em Dom Casmurro, estão representados dois tempos: o tempo do enunciado (os eventos que ocorreram na vida de Paulo Honório) e o tempo da enunciação ( o momento em que se escreve o livro).

A duplicidade temporal está ligada ao problema do foco narrativo, monopolizado por um eu-protagonista que , distanciado no tempo, abrange com o olhar toda sua vida e procura recapitulá-la, contando-a para si e para o leitor. É esse distanciamento que lhe dá uma pseudo-onisciência e reforça a impressão de objetividade derivada do caráter de Paulo Honório: rude, seco, direto. Todavia, quando entramos no presente da enunciação, esse distanciamento desaparece e o caráter ativo do memorialista está emperrado, paralisado pela derrota definitiva que foi a morte da esposa Madalena.

A narrativa ganha uma textura diferente: a linguagem seca do tempo do enunciado cede lugar à lamentação elegíaca do tempo da enunciação. O ritmo rápido da narrativa é substituído pelos compassos lentos de uma reflexão problematizadora, difícil e tortuosa: 'Aqui sentado à mesa da sala de jantar, fumando cachimbo, bebendo café, suspendo às vezes o trabalho moroso, olho a folhagem das laranjeiras que a noite enegrece, digo a mim mesmo que esta pena é um objeto pesado. Não estou acostumado a pensar, levanto-me, chego à janela que deita para a horta.'

São Bernardo é uma das mais convincentes análises do sentimento de propriedade, do sentido atávico da posse, do ter anulando o ser, do cancelamento ético e afetivo na luta pela vida. As personagens e as coisas surgem no romance como meras modalidades do narrador, Paulo Honório, filho de pais incógnitos, guia de cego que se elevou a grande fazendeiro, respeitado e temido, graças à tenacidade infatigável com que manobrou a vida, pisando escrúpulos e sentimentos e visando por todos os meios o alvo que declara desde o início: 'O meu fito na vida foi apossar-me das terras de São Bernardo, construir esta casa...'. Como pano de fundo, o coronelismo, a sociedade patriarcal do Nordeste e a Revolução de 1930 e seus desdobramentos, que ecoam também no sertão e golpeiam o combalido Paulo Honório.

Enredo de São Bernardo


Aborda a ascensão e a decadência de Paulo Honório, narrador da história, fazendeiro que conquista a propriedade que leva o nome do livro, uma fazenda em Viçosa.
Com uma linguagem renascentista, demonstra a angústia do personagem central, que a todo momento luta para escondê-la. No processo de adquirir tudo, de enriquecer, Paulo Honório acaba se desumanizando,e essa personalidade rude de Paulo Honório se arraiga a ele e se torna uma característica deste. Isso pode ser notado quando se diz que se arrepende das coisas que tinha feito, porém ele faria tudo de novo. A família de Honório se separa, pressionada pelo assassinato de Mendonça. Madalena, se vê sem saída e acaba morrendo (tudo leva a crer que ela se suicidou). O nome de seu filho é Enzo.
Personagens Pincipais
Paulo Honório: Homem já de idade, sobrancelhas cerradas e grisalhas, um tanto agressivo e violento, dá sua vida trabalhando na propriedade, São Bernardo, casa-se com Madalena, o que acaba sendo uma de suas grandes tristezas, porque acaba descobrindo que ela não é exatamente o tipo de companheira que queria. Tem alguns amigos em particular, mas sempre acaba na desconfiança, visão politica própria, sempre busca o que quer.
Madalena: Loura dos olhos claros, professora, criada pela tia D. Glória, a quem preza muito, casa-se com Paulo Honório e sai da cidade para morar em São Bernardo, moça entendida, conhecedora dos assuntos e sempre interessada, tem opinião própria e forte.
D. Glória: Tia de Madalena, acostumada a viver na cidade mas por cuidar da sobrinha desde sempre, decide morar com ela e o marido em São Bernardo. Já senhora, sempre viveu agitada, correndo de um lado para o outro para se sustentar e também a sobrinha, mas isso acaba quando vai para o campo.
Padilha: Antigo proprietário de São Bernardo, que herdara do pai, porém acabou perdendo para Paulo Honório devido à dividas. Viveu uma vida de economias indecentes e depois acaba dirigindo uma escola em São Bernardo. Torna-se chegado de Madalena, porém se acha um capacho da moça que o pede muitas coisas.
Ribeiro: Senhor já de idade, que vem da cidade para trabalhar com Paulo Honório. Teve uma vida respeitosa, porém perdeu tudo isso quando a cidade começou a se modernizar e já não precisavam mais dele. Sem dar opiniões nas conversas pessoais do patrão, torna-se amigo de D. Gloria.
Padre Silvestre: Um dos amigos de Paulo Honório, se envolve em política, mas quando se trata de patamares mais altos, a sua opinião é a mesma do jornal, e muita com frequência, até ele acaba sendo alvo de desconfiança de Paulo Honório.

Introdução ao Tema

Segundo romance de Graciliano Ramos, São Bernardo [1934] é uma das obras mais expressivas da vertente regionalista do segundo modernismo brasileiro, voltado, na ficção, para o questionamento social e psicológico, para o desnudamento dos anacronismos de uma sociedade primitiva, violenta, pré-capitalista. As mazelas e desigualdades do Nordeste Brasileiro foram o fermento da retomada da atitude crítica do Realismo/Naturalismo, enriquecida com o instrumental analítico das novas teorias sociológicas e psicológicas, e com as conquistas do Modernismo de 1922. Graciliano Ramos construiu seu próprio caminho e usou, com parcimônia, tanto a leitura marxista da luta de classes e da mais-valia, como as invenções formais da 'fase heróica', desdobramento da Semana de 22. Teve o discernimento de evitar os 'clichês' esquerdizantes da época e se opôs ao 'à vontade', ao informalismo, que tentava mimetizar, literariamente, o linguajar regional, a fala sertaneja.

Ao contrário, foi homem de esquerda, sem limitar-se a uma visão unilateral; foi moderno, sem concessões aos 'ismos' e facilitações do Modernismo. Por isso, é tido como o melhor escrito de sua geração.

O autor

Ao contrário de outros romancistas de 30, Graciliano Ramos jamais teve qualquer nostalgia do universo em derrocada das velhas oligarquias rurais. Analisou a realidade de onde procedia com aspereza, mesmo sendo descendente, tanto pelo lado materno como pelo paterno, de senhores latifundiários. Isso se deve, provavelmente, à clareza de suas idéias. E também a experiências infantis frustrantes dentro da sociedade patriarcalista que aguçaram-lhe a sensibilidade para as misérias de um sistema injusto e apodrecido.